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Direito Ambiental

UE deve anunciar hoje plano que veta produtos ligados ao desmate

Por Assis Moreira

A União Europeia (EU) deverá anunciar hoje seu plano para interditar a importação de carne bovina, soja, café, cacau, madeira e óleo de palma provenientes de desmatamento de florestas, no que pode colocar mais pressão sobre exportadores brasileiros. Os importadores europeus vão ter de certificar que essas commodities não vêm de desmatamento ilegal.

O Valor apurou que o plano deverá classificar países exportadores das commodities como de alto ou baixo risco, com os controles sobre as mercadorias dependendo assim de seu status. A Comissão Europeia, o braço executivo da EU, planeja usar uma referência (benchmarking) de países baseada na taxa de desmatamento, na expansão da terra agrícola e produção de commodities relevantes, na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) ao Acordo de Paris, em acordos bilaterais de comércio e em leis nacionais.

Basicamente, os países serão enquadrados como de “risco padrão”, o que exigirá a “due diligence” completa pelos compradores para evitar importar desmatamento. Mas, no caso de um país de alto risco de desmatamento, a commodity será submetido à “due diligence” completa e também poderão ser exigidas medidas adicionais (verificação por terceiros, auditorias especificas, escrutínio reforçado, por exemplo), para se alcançar um risco insignificante na operação. Já no caso de países com baixo risco, importadores poderão pedir uma avaliação simplificada que reduz na prática seus custos.

A União Europeia quer usar instrumentos como imagens de satélites para verificar a veracidade das declarações de proveniência dos produtores de commidities, segundo o presidente da Comissão de Meio Ambiente do Parlamento Europeu, o francês Pascal Canfin.

O desmatamento ilegal na Amazônia, que cresceu nos últimos anos, tem provocado alertas no Brasil e no exterior. Mas em outubro, ao tratar do plano europeu, o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio, Marcelo Brito, disse ao Valor que muitas cadeias no setor já monitoram a questão do desmatamento. “Não vejo muito impacto [do plano europeu no comércio brasileiro]. O desmatamento que ocorre no Brasil, hoje, está muito mais ligado a grilagem de terra e patrimonialismo do que com a expansão do agronegócio”, disse ele na ocasião.

Na Comissão Europeia, ocorreu um racha: o setor de comércio manifestou “sérias preocupações” com aspectos mais duros das regras propostas pelo setor de meio ambiente.

Um grupo de 55 ONGs suspeita que houve retrocessos na reta final, na visão delas, na regulação a ser anunciada. A informação que receberam é de que, em versão anterior do documento, a UE focava em desmatamento “legal e ilegal”, mas que o texto final poderá conter apenas “desmatamento ilegal”.

Pastagens do Cerrado e o Pantanal teriam sido excluídos da lei europeia antidestamatamento. Outra queixa de ONGs é de que algumas commodities de risco florestal (milho, couro e borracha) ficarão fora da proposta. Reclamam que a borracha foi excluída não por razões científicas, mas sim por causa de um forte impulso da indústria.

O plano também não incluiria mais uma medida para listar publicamente as empresas que violam a regulamentação nem dispositivos para que vítimas de violações levassem empresas ao tribunal.

No geral, ONGs consideram que a Europa dá um salto na boa direção, mas que a regulação proposta continuará insuficiente para diminuir o desmatamento.

“A longa batalha para acabar com o papel da UE na destruição das florestas e dos direitos da terra em todo o mundo está agora perto de ser vencida”, afirmou Nicole Polsterer, responsável de Campanha do Consumo e Produção Sustentáveis da ONG Fern, em Bruxelas. “Durante anos, os defensores tanto na Europa quanto nos países tropicais florestais têm têm exigido que a UE assuma a responsabilidade pelos danos ambientais e sociais causados por suas importações de soja, carne bovina, óleo de palma e outras commodities. Hoje a Comissão Europeia torna-se a primeira grande reguladora do mundo a dar tal passo.”

No entanto, acrescentou Nicole, a proposta europeia ainda tem brechas. Em particular, “depende das leis nacionais dos países produtores para determinar se as mercadorias estão ligadas a violações dos direitos humanos, como a apropriação de terras (‘land grab’)”. Além disso, diz, embora o plano possa ser visto como um divisor de águas, “os motores do desmatamento nos trópicos permanecerão enquanto existirem outros mercados para esses bens contaminados. A UE poderia ajudar a atacar as causas fundamentais do desmatamento nestes países, com base em fortes parcerias”.

Para os importadores, a preocupação é garantir acesso a commodities, respeitando o meio ambiente. Há vários pontos que eles esperam checar, que podem ter impacto no custo adicional nas importações. A expectativa é que o plano europeu entre em vigor por volta de 2025.

Fonte: Valor Econômico, 17/11/2021.
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